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sexta-feira, outubro 12, 2007

IV - "Eu"

É engraçado como é tão fácil por em palavras o que me rodeia, as pessoas, as relações, o mundo em si. Por outro lado é tão difícil descrever-me. E se tivesse mesmo que o fazer, como seria?

Tentando passar para o papel uma descrição pormonorizada do meu ser, começaria pela minha descrição física. Alto, vejo o mundo do meu metro e oitenta (para cima). Cabelo e olhos escuros, castanhos, olhar profundo, capazes de destruir ou intimidar apenas com o olhar e, da mesma forma, de resplandecer de luz quando a minha alma se enche quando estás aqui. Magro, a perder a musculatura que outrora me ornamentava o corpo; aqui aceito a minha culpa, pois os maus vícios (café, tabaco, alcool) e a má alimentação levaram-me a desperdiçar a clara forma que a vida me ousou dar. Mãos grandes de pele clara e braços longos, dizem que as minhas mãos proclamam a minha personalidade.

Numa interpretação individualizada da minha mente, talvez me ache profundo, enigmático, sempre em processamento de informação exterior e passando-a para o calor das palavras que mais tarde escrevo. Sou capaz dos sentimentos mais nobres e das maiores atrocidades. De estar um minuto em extase e no outro profundamente perturbado. Em parte, a minha personalidade liberal e fechada dá-me armas para me defender das intrusões dos outros e para, frequentemente, deixar passar coisas em branco que outros não deixariam.

Amo escrever, amo boa música, chocolate. Odeio ler, ser enganado, descobrir que fui enganado. Estou longe de ser uma pessoa perfeita, mas quem o é? Amo-te a ti.

Socialmente sou frio com o desconhecido, quente com os que amo, destrutivo e manipulador com os restantes seres. Não tenho muitos amigos, mas aqueles que têm o dom de me conquistar têm tudo de mim. Os outros, simplesmente são conhecidos ou não me interessam.

Neste momento vivo sozinho, numa casa de praia, na pequena cidade chamada “El Barrio”, algures nos arredores da “Nova Havana”, Cuba. Mudei-me para cá depois da ultima “revolucion”, que coincidiu com o meu primeiro lançamento literário, graças a mim um sucesso : “A vida como ela foi” – um romance. Agora escrevo para dois jornais online, semanalmente, “Crónicas de um Tuga no exterior”; também sou colaborador mensal numa revista dedicada às mulheres, onde tenho o meu espaço mensal : “Pelos olhos de um Homem”. Tudo isto pode ser feito online graças à minha ligação de 30 Mb/s, ao meu portátil e à boa vontade do governo que me acolheu como um ídolo. Aproveito também o isolamento a que me sujeitei para trabalhar no meu novo romance, ainda sem um nome, mas que espelha a solidão de viver longe dos que se ama. No tempo livre passeio o meu carro até às festas para que me convidam frequentemente e deixo o restante tempo para passeios inspiradores na praia, para as viagens pelo interior em busca de personalidades novas para os meus textos e para meditação profunda. Não vivo um sonho, longe disso, mas vivo a vida que escolhi, a vida em que sou potêncialmente mais feliz e, principalmente, sou senhor do meu destino.

As visitas dos meus “grandes” não são frequentes, mas são por demais inspiradoras; sinto a falta deles, apesar de estar num paraíso tropical. Comunicamos ainda assim, diáriamente, graças ao iMessenger, a evolução do velhinho Live Messenger, que hoje está fora de circulação.

A casa não é estupidamente grande, mas é onde sempre sonhei, em Cuba, junto ao mar. Tem três quartos, sala, cozinha, dois wc’s. Um dos quartos é o meu refúgio, o outro o dos hóspedes e o restante é o meu suposto escritório, onde poucas vezes vou. A sala e a cozinha contíguas e envidraçadas mostram a piscina no exterior e a praia, o mar. Tons claros no interior contrastam com o ar russo do exterior e os portões da entrada estão constantemente abertos. Não tenho animais de estimação, não tenho tempo nem vida para eles, e as visitas, os amigos cubanos que vão aparecendo e a velhota mulher a dias que são os únicos que frequêntam o meu lar sabem bem que está tudo aberto. Entristece-me nunca cá teres estado, mas quando te re-encontrar esta será também a tua casa.

Não sei dela desde que vim para aqui, escolheu desaparecer do mapa quando lhe disse que vinha para Cuba. Nova Havana não é o seu local de sonho para viver e o amor pela arte transporta-a pelo mundo nas suas viagens. O destino irá trazer-te até mim, eu sei, por isso uso a tua aliança no fio que trago ao pescoço.

E assim sou eu, Carlos, a viver um sonho, aos trinta anos. Talvez fosse assim que me descrevia, escrevo num papel em cima da secretária negra que ostento com tanto orgulho no quarto.

1 comentário:

Anónimo disse...

O tipico universita'rio... enorme tempo livre pa coça-los!
Dei uma lida aos novos textos, sempre em evolução a tua escrita ;)